domingo, 20 de maio de 2007

Nem sei por onde começar...

Mas vale a pena sempre tentar
Lembrar o que não sabemos esquecer:
Os percursos da vida vivida a correr
Os hiatos nas nossas emoções,
Tudo aquilo que nos fez sentir heróis
Nessas pequenas batalhas de fantasias,
Nessas alturas, nessas noites que serão sempre dias
Nesse enrolar de nós mesmos como fazem os caracóis
Nesses sons estrondosos como os dos trovões
Que são os gritos da nossa alma, do nosso querer
E tudo o mais que não se saboreia à mesa de um jantar.

E assim sendo
Saboreando as sobremesas do pensamento
No silêncio que sempre fazemos
Quando nos escutamos no meio da conversa dos outros,
Acontece em nós mesmos a exaltação
Desses momentos passados, presentes e planeados
Tão diferentes do nosso agir quotidiano
Mas que nos identifica e diferencia neste universo
Que são as constelações dos nossos relacionamentos com a vida.

Lembras-te meu amigo,
Daqueles momentos ténues que passaste contigo?
Lembras-te de que enquanto criança
Já o teu querer tinha uma esperança?
Recordas-te dos tachos e das panelas,
Agarrado às fraldas da tua mãe
A altura a que ficavam as janelas
As grades do teu berço
As viagens da tua imaginação,
Recordas-te como era saboroso olhar através delas?

Pois é assim amigo
Quis agora partilhar isso contigo e comigo,
E sabes porquê?
Porque no quotidiano nem sempre a gente se vê
E ele é feito de dias sucessivos
De ventos e marés
De calmarias e alegrias
De cinemas e televisão
De músicas que nos tocam o coração
De jardins floridos
De olhares queridos
De árvores de pele despida
De pessoas que encontramos na rua de mão estendida
De autoridades legítimas
De filhos que gritam ao colo dos pais
De cachorros de rabo entre as pernas
De caniches que deixaram de ser tratados como animais
De contradições que todos os dias nos chegam pela rádio
Das promessas dos chefes das nações
Das satisfações que temos que prestar aos patrões
Dos finais de mês em que contamos os tostões
Da falsa felicidade dos idosos nos bancos de jardim
De tanta coisa que não diz respeito a ti nem a mim
Do carro que de manhã não pega
Da beleza de um relvado envolvido na neblina de uma rega
Do parente que há muito a gente não vê
Dos amigos que vivem longe...
A vida do dia-a-dia é feita de tudo isso
E só tem sentido
Quando nos encontramos connosco
Quando em consciência ao beijar o nosso amor
Esquecemos aquela dor
Aquele discurso tosco
E encontramos em nós mesmos o aliado esquecido:
A recordação de quem fomos e somos.

Joaquim Marques

1 comentário:

Anónimo disse...

Um Rio com vida...

Nas águas límpidas de um rio
Corre a força de um olhar,
Não tem rosto, não tem olhar
Tem o sorriso puro de uma gota
e a certeza de te procurar.
Por pedras, correntes e ramos
Percorre distâncias infinitas
Sem nunca se encontrar,
Toca ténues imagens dos teus lábios
Na esperança de te abraçar.
De margem em margem perdida
Deixa-se no teu corpo aninhar
Numa entrega sem depois,
Num momento intemporal,
Para só depois sonhar.
Ao longe alcança terra
Na felicidade do teu amor,
Mergulha na profundidade, sem nunca hesitar
Entrega-se de alma na essência de amar
Apenas com vontade de te acarinhar.

:)