quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Beco

I

Aquela ruela
tão esguia quanto fria
desemboca num beco
e eu desconhecia,
situa-se longe do mar
e, ainda assim, cheira a maresia
são salpicos de lágrimas dela
escondida atrás da janela.

II

Vou-me embora do meu sonho
ao encontro da neblina
enquanto o Sol não desfaz o meu disfarce
ao dobrar aquela esquina
para te fisgar à janela
na mesma ruela
que no beco tem fim.

III

Vou chamar-te Amélia
queiras ou não, que te chame assim
hoje plantei um pé de camélia
nos fundos do meu jardim
só para me lembrar de ti atrás da janela
ao invés de chorar, sorrindo só para mim.

IV

Ando bêbado, embriagado é mais apropriado
canto coisas imaginárias
coisas tão contrárias
ao lamento que sempre canto de mim.
É a volta da vida que me traz assim
imagino-te Amélia, sorrindo sorrisos sem fim
alegre, pela alegria que se apoderou de mim
voltei a ter vinte anos, esperanças imensas
tenho o Mundo para conquistar
só não te concebo a chorar
na ruela que ao beco vai dar.

V

Quando em breve for rico
desmonto-me do meu jerico
compro uma máquina de arrasto
e arraso com o beco
para que da tua ruela
ao olhar à janela
vejas o mar e nele um veleiro
e nele eu a cantar
trovas novas por ti, por nós
por todos os que vivemos anos sós
presos em becos e ruelas frias
à janela a chorar.


Joaquim Marques AC